Fiz uma paragem na área de serviço de Leiria para beber um cafezinho e não
chegar demasiado cedo á Mealhada.
Ainda não eram 10 horas … estava á porta do Nelson, cheguei um pouco antes
dele.
Não demorando nada, estávamos na estrada para o percurso final. Fizemos uma
paragem já em Espanha, depois de Chaves, para meter gasóleo e continuamos
falando de caça. Fomos mastigando uns biscoitos que o Nelson se lembrou de
comprar e que me souberam lindamente e acabaram por adiar o almoço mais um
pouco.
Quando encontrámos uma área de serviço que nos agradou (em Espanha não é
fácil), fizemos mais uma pausa para comer um bucha, que os biscoitos, já eram.
Nova viagem até ao destino final, Campo de Caso.
Após um pequeno túnel, eis que surge uma rotunda e lá está a povoação de Campo
de Caso.
Parei e fiz questão de tirar as primeiras fotos….
Não demorando nada estávamos no hotel, muito bom por sinal.
Bagagens arrumadas e viemos para o bar, que funcionou um pouco como
quartel-general.
Antes do jantar apareceu o Guarda. Falámos de armas e agrupamentos. Tínhamos os
“alvos” e os agrupamentos que a menina do Nelson tinha feito, a ele não lhe
agradavam e ao guarda também não… a mim pareciam-me bonzinhos…
O agrupamento da minha menina estava na minha memória e tinha sido feito havia
cerca de um mês.
Estava na dúvida se caçava com a minha ou com a do Nelson….
Essa dúvida manter-se-ia até bem mais tarde.
Fomos buscar os petiscos que constavam de Broa da Mealhada, Pão caseiro de
Milfontes, leitão do Nelson e salada de ovas da minha casa, o vinho foi de lá e
bebia-se bem.
Belo jantar.
Após umas bebidas manhosas (por lá não há medronhos nem bagaços), fui
“estagiar” para o quarto.
Perguntei ao meu filho que arma deveria de levar…
Após a sua resposta decidi que iria levar a minha menina, uma BRNO 300 WM.
Nos intervalos dos sonos, lá andavam os Rebecos empoleirados nos rochedos.
Antes do despertador tocar já eu estava a tomar um duche e a preparar-me para a
grande caçada.
Na hora combinada e ainda bem antes do sol nascer lá partimos no Suzuki a
caminho da montanha.
Muito lentamente e por um carreiro cimentado, sempre em primeira e baixas, lá
fomos subindo, até que a estrada se acabou.
O dia começou a nascer, prepará-mo-nos. No meu caso, coloquei na mochila a bucha
para o almoço, uma garrafinha de tinto Alentejano e agua.
Os binóculos foram pendurados ao pescoço, o porta balas no cinto, a minha
menina ao ombro e o bordão na mão.
O Bordão revelou-se fundamental, principalmente nas descidas.
Começámos a subir por uns carreiros feitos pelas vacas e onde o gelo ia
estalando debaixo dos nosso pés...
Não demorando, uma paragem para observar um rebeco que nos observava lá das
alturas, binóculos nos olhos, não me parecia nada que valesse a pena, mas
esperei que os "experts" se manifestassem.
O guarda montou o Telescópio e confirmou o que eu tinha pensado, era bonito,
mas….
O Nelson informou-nos que estava a cerca de 250 metros.
Continuamos a subir. Subida inclinada. Comecei a notar alguma dificuldade em
inspirar pelo nariz e expirar calmamente pela boca. Uma vez por outra tinha que
inspirar pela boca.
Nos cabeços mais altos de Milfontes, consigo controlar facilmente a
respiração….
Alguma diferença havia.
O Nelson vinha um pouco mais atrás. De vez em quando o guarda parava,
provavelmente também se cansava. Eu aproveitava e descansava e reparei que nas
pausas ficava como novo, o que me alegrava.
Só via subidas …
Continuámos e vimos uma fêmea, com uma cria, relativamente próxima… até deu para
a fotografia.
Continuámos a subir, parámos num local já mais alto, tipo planalto, que estava
coberto de neve, lindo de ver , estava frio, mas um frio que até sabia bem.
Continuámos a subir, mas agora mais gradualmente e pisando neve. A sensação de
pisar era fofa.
Sempre que se parava, era caçar com os binóculos…
Chegámos a uma zona em que pensei que teríamos que tomar outro rumo, pois a
montanha que estava á frente parecia-me demasiado inclinada para subir.
Estava enganado, pois o guarda continuou em frente, lá fui atrás dele, olhava
para trás e… o Nelson lá vinha.
Chegámos a uma zona com alguma vegetação, mas que vista ao longe parecia que
não existia devido a estar coberta de neve, entre essa vegetação havia uns
carreiros, penso que feitos pelas vacas. Foi por lá que seguimos…
Parámos, observámos e o guarda descobriu um Rebeco que poderia ser
interessante, também o vi lá muito alto e longe.
Montou o “catalejo”, observou e disse que era bonzinho, observei-o, mas não me
pareceu nada por ai alem.
Estava a esgravatar, o guarda disse que estava a fazer a cama e que se ia
deitar, assim foi.
Estava a cerca de 370 metros.
Pensei cá para comigo, que alem de ser demasiado longe, seria difícil aproximar
mais… e que nem seria grande troféu.
O guarda resolveu abandonar a ideia, pelo menos por enquanto, desmontou a
aparelhagem e seguimos.
Não demorando muito ali na mesma encosta e vindo não sei de onde começaram a
aparecer bichos, fêmeas, machos… houve uma ocasião que me mandou preparar,
retirei a mochila das costas coloquei-a numa pedra e quando me aprontava,
disse-me que não valia a pena, que ainda não era aquele…
Levantámos arraial e seguimos. À nossa frente apresentavam-se uns rochedos
altaneiros. O trilho por onde caminhávamos localizava-se entre eles, o Nelson lá
vinha…
O guarda disse-me para ir preparado pois ao chegarmos lá acima, do outro lado
poderia haver algum bom animal, mas que o vento não era bom.
Continuámos a subir. Ele parava e espreitava, eu aguardava, ele avançava e eu
avançava, chegámos ao topo. Havia por lá machos e fêmeas, mas nada que
entusiasmasse, continuámos...
Nesta fase já me tinha esquecido da questão da respiração e não sei se
respirava ou não.
Continuámos, repentinamente o guarda atirou-se ao chão e disse para disparar….
Diiiisparar???????
Baixei-me. Indicou-me para usar o bordão como apoio. Lá ao longe via um rebeco
num rochedo, tentei abrir o bordão mas vi que aquilo não tinha jeito…
Dei-lhe a entender que havia uma pedra por cima dele e que queria ir para lá.
Anuiu. Desviou-se um pouco e fui para lá. Coloquei a minha mochila por cima da
rocha e quando encarei a minha menina só via gelo e neve na mira. Fiz-lhe
indicação desse pormenor. Descalcei uma luva para limpar a mira e entretanto
ele ofereceu-me um lenço com o qual a limpei.
Tentei encarar novamente a minha menina, mas não conseguia, o guarda já nervoso
e perguntou o que se passava. Disse-lhe que o apoio era demasiado baixo. Deu-me
também a sua mochila, que coloquei por cima da minha.
O guarda apressava-me, mas eu fazia ouvidos de mercador e não tinha pressa
nenhuma…
Assim já dava. Estorvava-me a luva da mão esquerda e com os dentes retirei-a.
Apercebi-me que era um tiro com muita inclinação, talvez uns 45º. Estava mal
apoiado, mas via bem o animal. Coloquei a mira nos 12 aumentos, esperei que
ficasse bem de atravessado, accionei o gatilho de cabelo, e quando o centro do retículo passou pelo ombro, toquei no gatilho e BUM…
O rebeco colocou-se literalmente de pé, uma mão a abanar, cai, não cai, não
cai…
O Nelson gritou que estava morto, o guarda dizia para disparar. Sentia algo
quente a escorrer pelo nariz, levei a mão ao sobrolho e confirmei que a mira me
tinha acertado…
O bicho veio na nossa direcção lentamente, apontei, disparei segundo tiro,
(parvoíce) não acertei…
A minha menina só leva duas munições, retirei do porta balas mais duas,
recarreguei, apontei, disparei e falhei.
Fogo…
O animal deslocava-se muito devagar mas não caía, apontei novamente, disparei,
caiu redondo.
Uff.
Gritava o Nelson… que já estava morto com o primeiro tiro, gritava o guarda que
agora é que estava, eu ouvia-os…