11 de março de 2013

Da Caça e de ser Caçador

Na sequência de uma reunião em que se encontraram algumas pessoas com responsabilidades, ou pelo menos com acção directa, no sector da Caça, que visava o aglutinar vontades numa defesa “a uma só voz” de algumas áreas especificas deste sector, dei comigo a cogitar sobre a própria Caça e o ser Caçador pela enésima vez e isto porque, em certa parte da discussão se alvitrou, ou pelo menos assim me pareceu, que a palavra Caça fosse eliminada de algumas siglas e nomes de entidades e programas existentes, para que fosse mais fácil o acesso ou a candidatura a projectos nas áreas como a Biodiversidade, o Turismo de Natureza e a conservação desta, e o termo Caça ser “mal aceite” pela sociedade em geral, o mesmo é dizer que por ser politicamente incorrecto o seu uso.
Não me contive e recusei terminantemente integrar qualquer grupo que, para defesa dos interesses da “Caça”, proponha eliminar esta palavra para uma melhor penetração, mesmo que temporária, nos circuitos politico-financeiros ou para outro qualquer desígnio ou por outra qualquer razão.
Após a reunião e depois de nesta ter sucinta, mas firmemente, explicado porque não aceitava tal proposta, dei comigo na viagem a explicar-me o razoável da minha postura e a colocar em formas coloquiais e socialmente inteligíveis as razões da minha opção. O curioso é que não me foi muito complicado, provavelmente porque para os apaixonados as razões mais insípidas serem (ou parecerem) soluções substanciais, mas a verdade é que não me foi mesmo nada difícil, a saber:

1- Se a Caça tem uma má imagem junto da Sociedade este facto deve-se, no geral, ao facto desta mesma Sociedade ter um elevado grau de desconhecimento da realidade desta actividade, muito por força da inanição dos próprios responsáveis deste sector, da desinformação que os média-generalistas praticam e da visibilidade que é dada aos nossos detractores, onde algumas organizações de pretensa defesa da Natureza e dos animais pontificam e que têm a cobertura dos média-generalistas, anti-caça, ambos, por princípio.
Assim sendo, o que devemos é promover a informação da realidade desta prática, contestando a desinformação e promovendo a divulgação nos média, convidando-os, repetidamente se necessário, a estar presentes nos nossos eventos e jornadas para que as possam presenciar e ser suas testemunhas, e refiro-me obviamente às nossas actividades normais e recorrentes, para que não sejam apenas notícia os mega-eventos pseudo-cinegéticos que normalmente são os que têm divulgação e nos quais a componente cinegética é muitas vezes de importância menor e até de discutível qualidade, estes terão o seu espaço mas não reflectem uma realidade.
  
2- A Caça é uma actividade com uma componente física sempre presente, exige ainda uma elevada capacidade de concentração e de manutenção desta por longos períodos de forma a identificar e resolver os lances que se apresentam e a sua conclusão exitosa. Assim sendo, é uma ferramenta indiscutível para a manutenção de uma saúde física e mental que a coloca ao nível das mais exigentes modalidades desportivas e de lazer.
  
3- A Caça tem ainda um “mais” pouco negligenciável, será das poucas actividades em que a um resultado nulo pode corresponder uma performance destacável. Passo a explicar, poucas são as actividades em que o (neste caso) Caçador pode chegar ao fim da jornada sem a obtenção de qualquer peça (por definição o objectivo procurado) e, paradoxalmente, ter efectuado uma fantástica e gratificante Caçada, como assim? Pois bem, é que numa Caçada o objectivo é a vitória sobre as estratégias defensivas dos oponentes (peças de caça) e um teste às nossas próprias capacidades de utilizar os meios existentes no seu (deles) habitat a nosso favor até, como epílogo, tomarmos posse da peça procurada. No entanto, durante uma caçada essas estratégias têm que ser utilizadas para evitar o alerta de um sem-fim de outras criaturas, obrigando-nos a “Caçar” a todo o tempo e não só perante a peça procurada, somando assim por vitórias todas as ocasiões em que o alerta é evitado. Para além disso, quando bem praticada, permite o desfrute de inúmeras cenas da Natureza no seu estado puro que estão vedadas a todos os que apenas contactam com a Natureza de forma invasiva, com motores, multidões, trajectos balizados, alimentação artificial, etc. permitindo-nos um acumular de conhecimento “de experiência feito” sobre as espécies com que comungamos o espaço de Caça e, naturalmente, sobre a Natureza no seu todo.
  
4- Tenho para mim que todos os Caçadores, os que realmente o são, são inevitavelmente grandes conhecedores da Natureza, dos seus habitantes e seus maiores apaixonados e também por isso defensores. Se este facto ainda assim fosse contestável, gostaria de saber quantos dos que integram as fileiras das organizações ditas “de protecção da Natureza” fizeram alguma vez alguma coisa que directamente resultasse na melhoria das condições de vida das espécies selvagens? Farão estudos e censos, estatísticas e propostas programáticas, destes alguns de duvidosa credibilidade pelo artificial da amostra e desconhecimento dos que recolhem os dados, mas e de facto acções directas? como limpar nascentes para a fauna beber, criar pontos de água, facultar comida para as épocas de escassez através de culturas apropriadas e, se necessário, da disponibilização de alimento em épocas de escassez total, ou quando as catástrofes naturais assim o obrigam? pois bem, no grémio dos Caçadores quase e todos mas nunca os encontrei a ser executados pelos agentes daquelas organizações que, temo, estarem mais preocupadas com as suas próprias sobrevivências que com a das espécies cuja protecção tanto anunciam.
  
5- Creio que aqueles não saberão que, até inadvertidamente, ajudamos um número infinito de espécies, dou-vos como exemplo os cevadouros para perdizes ou dos javalis, todos os que já os fizemos (fazemos) e mantemos, podemos observar (e com as novas tecnologias até registar para análises posteriores) o número de espécies que ali se alimentam, desde a formiga que “rouba” o trigo, à Águia ou ao “extinto” lince que ali sabem encontrar as presas que necessitam, passando pelo Chapim que não comendo o grão, sabe que nele se desenvolvem insectos dos quais se poderá alimentar. Não sendo o objectivo em si mesmo, é uma consequência inevitável esse auxílio a todas as espécies.
  
6- São os Caçadores os que mais pugnam para que as técnicas agrícolas se “adaptem” aos ciclos biológicos suplicando (porque é este o termo) a proprietários e empresários agrícolas, nas propriedades que gestionam, para retardarem ceifas e desmates (por exemplo), para permitir a tranquilidade e sobrevivência das espécies que ali nidificam até à capacidade de fuga dos juvenis. Acreditem que não é fácil pois as espécies não têm a capacidade de adaptar os seus ciclos biológicos ao ritmo das alterações das práticas agrícolas, cada vez mais precoces e rápidas.
Os espaços de Gestão Cinegética que contemplam a prática da Caça são, no geral, de maior riqueza no respeitante a Biodiversidade e qualidade ecológica que os restantes, os números falam por si.
Com excepção dos trabalhadores rurais e destes só alguns, poucos haverá maiores conhecedores “do campo e dos seus habitantes” que os Caçadores, algum que outro investigador dedicado, certamente, mas em número garantidamente reduzido. É com agrado, e devo afirmá-lo porque é uma realidade, que registo cada vez com maior frequência o pedido da nossa (Caçadores) participação e auxílio por parte de cientistas e investigadores, esse é o caminho, juntos teremos uma visão melhor e mais fiel da realidade e assim fazer melhor porque mais documentado.
  
7- Os Jovens não se sentem motivados para esta nossa actividade? Naturalmente! Se a imagem que recebem do Caçador é sempre “colada” a uma morte aleatória e injustificada e a um colectivo de bárbaros, é natural que não se sintam interessados, se para além disso os manuais escolares, e outros textos de referência, têm alusões a esta imagem e ninguém a contesta, como queremos que se sintam motivados e curiosos? Impossível!
A curiosidade e apelo só se criarão se todo o colectivo dos Caçadores se unir em torno do dever da informação e difusão da nossa actividade, indo às escolas, às Faculdades, aos Politécnicos, à Sociedade no geral e pedindo (quando não exigindo) aos organismos e seus órgãos directivos a oportunidade de apresentar a nossa actividade, porque legal e juridicamente enquadrada, junto dos seus alunos, componentes e cidadãos, esclarecendo e informando sobre a realidade e significados do que são a Caça e o ser Caçador e sistematicamente corrigindo e pedindo a rectificação ou eliminação dos textos ou outras formas de publicitação que difamem ou distorçam o significado e práticas de ambos os termos, Caça e Caçadores.
  
8- Finalmente existe também uma razão económica, não está contabilizada de forma credível e segura mas é inquestionável que a Caça, directa e indirectamente, movimenta milhões de euros e sabemos que se acarinhada ao invés de maltratada poderá aumentar significativamente o seu impacto na Economia.

Em conclusão, recuso-me a ser TCPS (Técnico de Controlo de Populações Selvagens) ou ACES (Agente de Controlo de Espécies Selvagens) para assim poder formalizar candidaturas ou passar desapercebido ou colado para financiamento à Biodiversidade, ao EcoTurismo ou outras quaisquer formas de promoção e defesa da Natureza, ao contrário, o facto de ser Caçador e de Caçar devem ser pontos favoráveis e distintivos porquanto já de si abonatórios do meu conhecimento daquelas realidades e da sua manutenção e promoção.

Paulo Farinha Pereira
Caçador

Texto e foto da autoria de Paulo Farinha Pereira

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