7 de maio de 2014

Uma Viagem pelo Mundo da Cinegética no Uruguai

Um grupo de seis amigos e conhecidos caçadores decidiram este ano ir fazer a abertura da caça ao Uruguai, designadamente às perdizes e às lebres. Para tal fizeram-se acompanhar de três Epagneul Bretões, duas fêmeas e um macho, entre as fêmeas incluía-se a minha Pipoca que já no mês de Julho completa sete anos, e o que lhe falta em capacidade de resistência sobra-lhe em experiência. Os nossos cães de parar adaptam-se muito bem à caça da perdiz Uruguaia já que esta variedade de perdiz  se assemelha muito às nossas codornizes bravas dos Açores, embora tenha uma envergadura  substancialmente maior.  Um cão bem rodado na caça às codornizes nos Açores e que tenha um bom nariz, no segundo dia de caça  já se apercebeu das artimanhas que a perdiz Uruguaia utiliza para se furtar aos predadores e que são muitas.
A caça a estas espécies cinegéticas no Uruguai começa no primeiro de Maio, coincidindo precisamente com o Outono na América do Sul.
Este ano tomamos a opção de não nos integrarmos em nenhuma organização profissional de caça, embora contássemos com o apoio de uma espingardaria em Montevidéu que nos ajudou no acesso a todas as licenças que nos habilitaram a caçar legalmente no Uruguai e nos vendeu as munições. Foi também imprescindível para o sucesso desta organização o apoio de uma família local e na qual destaco um ex-guia de caça que, presentemente, desempenha outra atividade profissional,  mas por uma  amizade antiga nos ajudou muito com a sua experiência e conhecimento dos terrenos. Ainda neste capítulo a vinda antecipada para o Uruguai do Dinis, em cerca de dois dias, também foi determinante.
A caça no Uruguai é dos proprietários dos terrenos e ninguém lá caça sem a sua autorização, e é precisamente neste pormenor que se joga uma parte muito importante dos resultados a obter no acto cinegético, já que a outra parte diz respeito à qualidade dos nossos cães. O acesso a um campo-terreno (1000 a 5000 ha)  pode variar de  quarenta a cem euros, o que no nosso caso dava um custo per capita de cerca de cinco euros. Os terrenos, na sua maior parte, são cultivados com soja e pasto para o gado de carne e leite. Nos cinco dias em que cacei sempre acompanhado com a minha Pipoca fiz resultados extraordinários, com lances inesquecíveis,  e o mesmo se pode dizer dos outros dois grupos de caçadores, já que cada cão de parar caçava com dois caçadores.
Um outro aspecto a destacar foi a elevada componente social muito fortalecida com refeições magistralmente confeccionadas no campo,  aproveitando parte do produto da caça e com o bacalhau levado de Portugal, já que os Continentais que integravam o Grupo se não comessem  bacalhau ficavam muito infelizes. Eu e o José Correia fomos os cozinheiros de serviço, cozinhando eu a caça e ele o bacalhau.
Continua muito impressionante, pela positiva, a riqueza da fauna Uruguaia com particular destaque para as aves, com espécies  muito variadas e de uma beleza indescritível. Do meu ponto de vista mereciam um estudo aprofundado e com toda esta riqueza poderiam incluir roteiros de observação de aves do mais fascinante que se pode imaginar.
Uma outra nota muito positiva vai para a população Uruguaia e em particular a de Trinidad que é a capital do Departamento de Flores. As pessoas ainda se cumprimentam sem se conhecerem e dar os bons dias é mesmo uma prática corrente. Trinidad tem cerca de vinte e um mil residentes e o Departamento de Flores vinte e cinco mil habitantes, com uma área de 5146 Km2, predominantemente agrícola (soja, sorgo, pasto, trigo, cevada e girassol). Eu que quando viajo para estas terras é mesmo para caçar, também aprecio estes pormenores e a etnologia e etnografia Uruguaia.
Soube bem festejar no Uruguai a Vitória do Benfica sobre a Juventus e depois de mais uma caçada muito agradável.
De referir como muito emocionante o reencontro que tive com o Tito,  um Setter Inglês  com quem tive o privilégio de já ter caçado no Uruguai  em tempos idos, e foi muito comovente verificar como ele me reconheceu, foi com muito esforço que tive de conter umas lágrimas . Numa das viagens anteriores não o trouxe  comigo para os Açores devido às complicações e entraves que são colocados ao transporte aéreo de cães. Fui informado que o dono deste Setter, o Nelson Gutierres, tinha falecido o ano passado num trágico acidente com uma carrinha de transporte.
A parte mais negativa deste empreendimento é a caça se desenvolver em terrenos com  produções  excluindo a pastagem, baseadas em métodos de produção intensiva e com o recurso progressivo a químicos e pesticidas,  como é visível na produção da soja. As consequências imediatas são uma redução de todas as espécies bravias que habitam naqueles terrenos e a prazo será a exaustão dos próprios solos como ocorreu em Portugal no Alentejo com a Campanha do Trigo durante o Estado Novo.
Este tipo de produções está a gerar elevados rendimentos de curto prazo e são fruto da procura acrescida para a produção de energia com o recurso à soja.
Um outro aspecto muito negativo são as infindáveis burocracias a que os caçadores são sujeitos nos Aeroportos e nas companhias de aviação quando se fazem acompanhar de cães de caça e de armas de caça, uma autêntica tragédia. Viajar hoje para um caçador deixou de ser um acto alegre e de boa disposição, e transformou-se num sacrifício, razão porque dificilmente regresso a estas paragens. Para me chatear já bastam as viagens inter-ilhas nos meus Açores, e quanto a estas,  e enquanto tiver saúde nunca vou desistir, pois não me importo de as ter de suportar e fazer todos os sacrifícios para praticar a caça com cão e que tanto valorizo.

Texto e foto da autoria de Gualter Furtado

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