12 de dezembro de 2009

Galinholas

Assim se designa este livro, cujo autor se trata de Fernando de Araújo Ferreira, irmão de Júlio de Araújo Ferreira.

Esta obra da literatura portuguesa foi composta e impressa no ano de 1949, na Tipografia e Papelaria "A Gráfica", em Tomar, numa altura em que a Europa, devastada pela guerra, muito se esforçava por emergir de um dos mais negros períodos da sua História, que foi a Segunda Guerra Mundial.


Nesse final de década, do séc. passado, na ilha açoriana do Faial, o, então, Capitão Júlio de Araújo Ferreira, tirou as primeiras fotografias de galinholas deste País permitindo, assim, que chegassem até nós através deste excepcional documento que permanece tão actual como o foi no dia em que nasceu.

Possui mapas de rotas, registos datados, medições de exemplares, correspondência trocada com as mais ilustres e distintas personalidades, instituições e universidades estrangeiras, relatos na primeira pessoa, e, uma prosa encantadora, fascinante que nos desperta, estimula e desafia.

"... Não sei se já repararam neles, na expressão desses olhos, quando à vossa mão vai parar uma galinhola de asa... Eu creio que nenhum caçador, que tenha sensibilidade, possa demorar a sua atenção no olhar da galinhola sem que sinta pena, sem que lá dentro haja uma certa revolta por roubar aquela vida à extensão das florestas, à solidão do seu destino. Olhos que parecem chorar muito embora não haja lágrimas vulgares, líquidas, mas sim as que se adivinham na expressão pungente que nos lança, expressão de desalento de saudade.
É assim e eu o sinto... mas no fundo sou essencialmente caçador, corre-me nas veias aquele fogo primário que através de tudo, da própria sensibilidade, nos faz andar em frente como o animal que caça, como o homem bárbaro das cavernas, ou, até, como a «mesmíssima» galinhola - cuja agonia sentimos - ao devorar os seus vermes.

... Caçador é aquele que entregue a si mesmo, sozinho se necessário for, sabe procurar e sabe perseguir, se adapta aos terrenos e parece dotado dum sexto-sentido a que os «caçarretas» chamam muito simplesmente... «leiteira». Caçador não é sinónimo de matador e muito menos de exterminador.
O vulgo, aqueles que vivem longe das realidades do mato, confundem muita vez o bom atirador com o bom caçador. E no entanto a diferença é notória e vasta.

... A caça das galinholas, de salto e na floresta, é só para caçadores, para os que têm em si o «fogo sagrado».

... A vida começa e termina ali, num cão que se pára, numa galinhola que salta, numa finalidade que se realiza. Nada mais para além, nem cidades, nem mundo, nem lutas ou misérias humanas; nós, a vida livre, a raíz da nossa condição de animal caçador a embeber-se na seiva natural que nos envolve.

... Para muitos não há mais do que horas da mesma vida, hoje, amanhã, depois... sempre!
Horas civilizadas de funcionários ou empregados, do homem de hoje, horas que rolam iguais pela vida fora, o mesmo pão, a mesma «fome», a mesma cama, e a esperança doutro rumo a esfumar-se na eterna e gelada realidade ou a acalentar-se como sonho inútil e perdido.
Porque não há-de ser a caça para esses... LIBERTAÇÃO!
Perdidos em considerações fechámos este capítulo. Perdoem-nos os caçadores."


Disse-o Fernando de Araújo Ferreira em algumas das 140 páginas que escreveu e assim que finalizou este maravilhoso livro, numa demonstração da sua nobre qualidade e de uma grande coragem, há 60 anos atrás!

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