31 de dezembro de 2009

Caça e Felicidade

"A vida que nos é dada tem os seus minutos contados e, além disso, é-nos dada vazia.
Quer queiramos quer não, temos que preenche-la por nossa conta: isso é, temos de ocupa-la, de um ou de outro modo.

Por isso a substância de cada vida reside nas suas ocupações.

Ao animal não somente lhe é dada a sua vida, mas também o reportório invariável da sua conduta. Sem a sua intervenção, os instintos dão-lhe já decidido o que vai fazer e evitar. Por isso, não pode dizer-se do animal que se ocupa muito nisto ou naquilo. A sua vida não esteve nunca vazia, indeterminada.

Mas o homem é um animal que perdeu o sistema dos instintos, ou, o que é igual, deles conserva só resíduos e cotos incapazes de lhe impor um plano de comportamento. Ao encontrar-se existindo, encontra-se perante um pavoroso vazio. Não sabe o que fazer; tem ele mesmo que inventar os seus afazeres ou ocupações.

Se contasse com um tempo infinito diante de si, não importaria grandemente: poderia ir fazendo o que lhe ocorresse, experimentando, uma após outra, as ocupações imagináveis. Mas - aí está! - a vida é breve e urgente; consiste sobretudo em pressa, e não há outro remédio senão escolher um programa de existência, com exclusão dos restantes; renunciar a ser uma coisa para poder ser outra; em suma, preferir umas ocupações às restantes."

- excerto retirado do capítulo "Caça e Felicidade", do livro "Sobre a Caça e os Touros", de Ortega y Gasset


Na fotografia, o meu avô está de óculos escuros e boina e esta retrata a primeira caçada realizada na zona das pistas, no Aeroporto de Santa Maria, nos inícios da década de 60, do séc. XX.
Da esquerda para a direita está o Sr. Soares, atrás dele encontra-se o Sr. João Caraça. De joelhos, à frente, situa-se o Mestre João "dos frigoríficos" e, atrás, com um chapéu de aba larga, o Sr. Sargento Pereira, da Guarda Fiscal. À frente do meu avô, está o Sr. José "Espanhol", faroleiro de profissão. Os restantes não fui capaz de identificar.
Nela, são também visíveis as nossas foices de caça e o produto de uma bonita caçada!

O meu avô soube preencher todos os minutos da sua vida e ocupou-a o melhor que pôde, não deixando nunca que o que quer que fosse lhe controlasse ou tomasse o destino, lhe roubasse a substância ou deixasse de ser quem era.
Viveu-a plenamente e fê-lo sem medo de perder ou ganhar, porque é necessário coragem para assumir tanto a derrota como a responsabilidade da vitória e ele teve dumas e doutras, viveu a vida sem renunciar a nada, nem a ninguém.
Acredito que tenha sido feliz e foi de certeza o Caçador que eu pretendo ser!

29 de dezembro de 2009

Galinholas Homenageado

"O Templário", semanário, com sede em Tomar, publicou na sua edição de 24/12/2009, um artigo sobre o livro "Galinholas", de Fernando de Araújo Ferreira, intitulado "Galinholas - editado há 60 anos".


O texto divulgado teve como base a transcrição da composição que elaborei sobre essa obra ímpar da literatura cinegética nacional e começa nos seguintes termos:



"A efeméride é assinalada pelo açoriano Pedro Miguel Silveira no seu blogue ribeira-seca.blogspot.com.
O livro "Galinholas", da autoria de Fernando (Nini) de Araújo Ferreira, irmão de Júlio de Araújo Ferreira, foi editado há 60 anos.
A propósito e com a devida autorização do autor, transcrevemos o apontamento que fez no seu blogue: ..."
.

14 de dezembro de 2009

Um Presente de Natal

Para o Natal proponho um excelente livro.

"Páginas de Caça"

Teve a sua primeira edição em Janeiro de 2009 e tem por base uma rica selecção de textos e organização da responsabilidade de A. M. Pires, que a Câmara Municipal de Macedo de Cavaleiros publicou em associação com a Âncora Editora.

Poderá ler-se na apresentação efectuada pelo Eng. Beraldino Pinto, Presidente da Câmara de Macedo de Cavaleiros, o seguinte:

"A caça tornou-se uma marca indelével da identidade do concelho de Macedo de Cavaleiros. Inspirados pela beleza das paisagens, por uma boa jornada de caça e pelo saber receber dos macedenses, são muitos os caçadores que desde tempos longínquos aqui acorrem. A Festa dos Caçadores do Norte e a Feira da Caça são igualmente testemunhos dessa marca que se vai transmitindo entre gerações.
A caça, mais do que o simples acto venatório, pelo contacto que proporciona com a natureza e as peripécias dos caçadores, é também fonte de inspiração literária. A obra de Miguel Torga é um notável exemplo de momentos de caça vertidos em literatura. Como Torga, muitos foram e são os autores transmontanos, uns reconhecidos, outros desconhecidos da maioria, que escreveram em prosa ou verso, sobre a ancestral actividade que é a caça. A produção literária é imensa, mas por vezes publicada em edições de difícil acesso à maioria dos leitores, e daí a necessidade de a compilar.
O epíteto de concelho da caça confere ao Município de Macedo de Cavaleiros condições de excelência para ser o percursor da primeira antologia sobre caça na literatura transmontana.
Acrescentou-se ainda o privilégio de Macedo de Cavaleiros ter um homem desta terra, o Dr. Pires Cabral, escritor de reconhecido valor e exímio organizador de antologias. A conjugação germinou na antologia que tem entre mãos, obra que reflecte um trabalho exaustivo de levantamento e compilação de textos por parte do Dr. Pires Cabral, a quem o Município de Macedo de Cavaleiros agradece ter aceite o convite para organizar esta ontologia e o incondicional empenho que nela depositou.
O Município de Macedo de Cavaleiros orgulha-se de promover esta publicação que vem suprimir uma lacuna na literatura transmontana e nacional e de ter o seu nome inscrito nessa antologia de textos sobre caça escritos por autores transmontanos."

Deixo-vos um pouco do que poderão encontrar, neste excerto de Miguel Torga:

"Vamos, irmã de Apolo!
Ladram de impaciência os cães à nossa espera.
de espingarda traçada a tiracolo.
Não há fera
Que nos resista...
Somos o instinto, a força e a quimera.
Na sua eterna e lúcida conquista!

Como não obtinha resposta, procurava na caça a libertação desse e doutros pesadelos. No regresso às primárias leis da vida, à virgindade nativa do instinto, o pensamento cessava, e a lancinante dor de o possuir amortecia.
- Ferido, Nilo! Busca lá...
Uma perdiz levantara voo no planalto, abrira-se inteira à pontaria, recebera no peito o relâmpago do tiro, e continuara como uma seta.
de repente, lá longe, num último arranco, erguera-se a pino, de bico ao céu, e subira, até se lhe acabar o alento. Só então caíra maciça e perpendicular sobre o abismo.

Desde a roupa que vestia, delida como um velho paramento e afeiçoada aos movimentos do corpo como uma segunda epiderme, á frugalidade sã da merenda, sempre igual, ao vinho bebido excepcionalmente, tudo fazia parte de uma secreta comunhão com a sacralidade da natureza. O dia raiava na emoção do primeiro disparo. Antes que a vontade hesitasse, o estalão das passadas tornava próxima qualquer distância.
Alheia ao suor da fadiga, a atenção ia acompanhando, por relances, objectiva e deslumbradamente, a consumação circular do tempo e a variação ondulada dos horizontes. Quando as forças decaíam, a tarde declinava também. A última perdiz morta era o sol posto."

Além do citado Miguel Torga, encontrarão também Fausto José, António Cabral, Sousa Costa, P.e Domingos Barroso, Camilo Castelo Branco, João de Araújo Correia, Ângelo Sequeira, Salvador Parente, A. M. Pires Cabral, Vaz de Carvalho, João de Deus Rodrigues, Manuel Vaz de Carvalho, Dr. Ferreira Deusdado, Mello Júnior, Montalvão Machado, Cristiano de Morais, Bento da Cruz, Guedes de Amorim, Fernando de Mascarenhas, António Fortuna, Gil Monteiro e Pina de Morais.

São 277 páginas de caça, do melhor que existe na literatura transmontana e do País, uma excelente oferta de Natal.

12 de dezembro de 2009

Galinholas

Assim se designa este livro, cujo autor se trata de Fernando de Araújo Ferreira, irmão de Júlio de Araújo Ferreira.

Esta obra da literatura portuguesa foi composta e impressa no ano de 1949, na Tipografia e Papelaria "A Gráfica", em Tomar, numa altura em que a Europa, devastada pela guerra, muito se esforçava por emergir de um dos mais negros períodos da sua História, que foi a Segunda Guerra Mundial.


Nesse final de década, do séc. passado, na ilha açoriana do Faial, o, então, Capitão Júlio de Araújo Ferreira, tirou as primeiras fotografias de galinholas deste País permitindo, assim, que chegassem até nós através deste excepcional documento que permanece tão actual como o foi no dia em que nasceu.

Possui mapas de rotas, registos datados, medições de exemplares, correspondência trocada com as mais ilustres e distintas personalidades, instituições e universidades estrangeiras, relatos na primeira pessoa, e, uma prosa encantadora, fascinante que nos desperta, estimula e desafia.

"... Não sei se já repararam neles, na expressão desses olhos, quando à vossa mão vai parar uma galinhola de asa... Eu creio que nenhum caçador, que tenha sensibilidade, possa demorar a sua atenção no olhar da galinhola sem que sinta pena, sem que lá dentro haja uma certa revolta por roubar aquela vida à extensão das florestas, à solidão do seu destino. Olhos que parecem chorar muito embora não haja lágrimas vulgares, líquidas, mas sim as que se adivinham na expressão pungente que nos lança, expressão de desalento de saudade.
É assim e eu o sinto... mas no fundo sou essencialmente caçador, corre-me nas veias aquele fogo primário que através de tudo, da própria sensibilidade, nos faz andar em frente como o animal que caça, como o homem bárbaro das cavernas, ou, até, como a «mesmíssima» galinhola - cuja agonia sentimos - ao devorar os seus vermes.

... Caçador é aquele que entregue a si mesmo, sozinho se necessário for, sabe procurar e sabe perseguir, se adapta aos terrenos e parece dotado dum sexto-sentido a que os «caçarretas» chamam muito simplesmente... «leiteira». Caçador não é sinónimo de matador e muito menos de exterminador.
O vulgo, aqueles que vivem longe das realidades do mato, confundem muita vez o bom atirador com o bom caçador. E no entanto a diferença é notória e vasta.

... A caça das galinholas, de salto e na floresta, é só para caçadores, para os que têm em si o «fogo sagrado».

... A vida começa e termina ali, num cão que se pára, numa galinhola que salta, numa finalidade que se realiza. Nada mais para além, nem cidades, nem mundo, nem lutas ou misérias humanas; nós, a vida livre, a raíz da nossa condição de animal caçador a embeber-se na seiva natural que nos envolve.

... Para muitos não há mais do que horas da mesma vida, hoje, amanhã, depois... sempre!
Horas civilizadas de funcionários ou empregados, do homem de hoje, horas que rolam iguais pela vida fora, o mesmo pão, a mesma «fome», a mesma cama, e a esperança doutro rumo a esfumar-se na eterna e gelada realidade ou a acalentar-se como sonho inútil e perdido.
Porque não há-de ser a caça para esses... LIBERTAÇÃO!
Perdidos em considerações fechámos este capítulo. Perdoem-nos os caçadores."


Disse-o Fernando de Araújo Ferreira em algumas das 140 páginas que escreveu e assim que finalizou este maravilhoso livro, numa demonstração da sua nobre qualidade e de uma grande coragem, há 60 anos atrás!

10 de dezembro de 2009

Entronização de Confrades da C.G.C.A.

Numa cerimónia realizada no dia 6 de Dezembro de 2009, nas instalações do Clube Cinegético e Cinófilo da Praia da Vitória, ilha Terceira, procedeu-se a uma cerimónia de entronização de 12 novos Confrades da Confraria de Gastronomia Cinegética dos Açores.

De enaltecer a realização da primeira entronização de uma mulher Confrade e que se tratou da jovem Júlia Ourique.

O evento contou ainda com a participação da Confraria do Verdelho, representações da Câmara Municipal da Praia da Vitória, Secretarias Regionais da Economia e da Agricultura e Florestas, bem como do Representante da República para os Açores, o Juiz Dr. José Mesquita.

As entronizações foram presididas pelos Presidentes da Direcção e da Assembleia Geral, respectivamente Olívio Ourique e Gualter Furtado.

De seguida foi servido um jantar a todos os Confrades e Convidados, cuja ementa foi a seguinte :

- Canja de pomba da rocha
- Arroz de pato bravo (real e marrequinha)
- Coelho bravo frito
- Alcatra de coelho bravo
- Codornizes bravas fritas com molho regional
- Galinhola na Caçarola
- Lebre com feijão
- Javali assado no forno

Entretanto, no dia 5 de Dezembro, no salão nobre da Câmara Municipal da Praia da Vitória, uma ampla delegação da Confraria de Gastronomia Cinegética dos Açores participou na cerimónia de entronização que a Confraria do Vinho Verdelho fez ao Presidente do Governo dos Açores - Carlos César.


Texto e fotografias da autoria de Gualter Furtado

9 de dezembro de 2009

Homenagem ao Jornal - Caça

No dia 05 de Dezembro de 2009, o jornal diário Açoriano Oriental publicou um artigo da autoria de Gualter Furtado, sob o título de "A minha homenagem ao Jornal - Caça", que poderá ser lido a seguir.

"Recentemente numa véspera de uma caçada às Galinholas na Ilha do Pico, na Piedade e na perigosa adega do Cremildo, entre algumas histórias de caçadores e um copito de nêveda, aguardente de figo, etc, um caçador continental de nome Nuno Sebastião, perguntou-me se eu já tinha ouvido falar num jornal de caça que tinha sido publicado em São Miguel na década de 30 do séc. passado. Eu respondi que não, mas que em breve e a ser verdade ia procurar ler todos os números deste jornal.
O Nuno Sebastião é detentor de uma das mais importantes bibliotecas de cinegética sobre a caça no “Mundo Português”.
Já em São Miguel contactei o Pedro Miguel Silveira de Santa Maria que também é um caçador bem informado e pai de um dos melhores blogues de caça do País (Ribeira Seca), que prontamente me confirmou esta informação, mais, disse-me que o jornal de nome Caça foi fundado em 1936 e o seu número 1 saiu no dia 1 de Junho de 1936 que era um jornal "mensário e de distribuição gratuita aos Caçadores do Distrito (São Miguel e Santa Maria)" e que o seu Redactor - Editor - Proprietário era o Senhor Eduino G. Botelho.
Munido desta informação pedi ajuda ao Senhor Albano Martins do Vale (Bibliotecário, Pescador e Caçador) que prontamente localizou na Biblioteca Pública e Arquivo Regional de Ponta Delgada os 11 números do jornal que penso serem a totalidade da edição desta pioneira e louvável iniciativa realizada no séc. passado. Portanto o meu muito obrigado ao Sr Albano Martins do Vale.
Este jornal editado na gráfica do Açoriano Oriental merece ser recordado hoje e a minha sentida homenagem à meia dúzia de caçadores que tomaram esta iniciativa.
O jornal publicou-se em 1936 e 1937 e tem artigos muito pedagógicos e informações muito úteis para a população e para os caçadores de então. Artigos sobre as espécies cinegéticas, as doenças dos cães de caça, introdução de faisões e perdizes, combate aos furtivos, eram frequentes e alguns deles mantêm a sua actualidade.
Através do jornal Caça pode-se constatar o pioneirismo dos Serviços Florestais de então na promoção da caça, e que deveria ser um incentivo acrescido para a versão actual dos Serviços Florestais.
Os Colaboradores eram meia dúzia de entusiastas pela caça desejosos de levar ao conhecimento dos caçadores e população rural a importância da caça, e designadamente as regras, as leis, as espécies cinegéticas que regiam e constituíam o Mundo da Caça.
Não resisto em transcrever parte do editorial publicado no Nº 1 do Jornal Caça: "... É nosso objectivo despertar o interesse dos caçadores pela caça e nestas palavras cabe tudo o que por este magnifico desporto é necessário fazer-se para que no nosso meio haja caça, haja caçadores e para que cada um tenha por este assunto toda a dedicação, todo o carinho, e até mesmo todo o respeito...” Como são tão actuais estas palavras escritas já lá vão 73 anos!
Aqui fica a minha Homenagem aos Senhores Eduino G. Botelho, Eduardo Rebelo, Vasco Bensaude e a todos os que participaram nesta iniciativa de Cidadania a favor da Caça com regras, entusiasmo e respeito."



Para concluir este "post", gostaria de salientar o seguinte:

- A referência elogiosa que nos é dirigida directamente e que muito nos sensibiliza, em verdade, não a merecemos, pelo que a mesma só poderá ser compreendida em função da vasta educação e delicadeza que caracteriza o autor do texto acima, demonstrada, também, através da enorme partilha de informação e da empenhada colaboração na construção deste lugar de Caça.

- Quem nos deu a conhecer a existência do jornal "Caça" foi o Sr. Nuno Sebastião, aliás, é aos bons conselhos dele que devemos alguns dos bons livros que temos a sorte de desfrutar e de compartilhar, sendo este, precisamente, o nobre sentimento que nos une e que também esteve na origem do Jornal - Caça.

A Todos, bem hajam!

8 de dezembro de 2009

Na Calibre 12

A Calibre 12 - A revista do caçador português, publicou-o em Janeiro do corrente ano.

Teve como base o texto que escrevi neste blogue, sob o título de Caça em Segurança, em 16 de Agosto de 2008, e algumas fotografias que me foram solicitadas.

A Segurança no Manuseamento de Armas de Caça



















Faço votos que o ano de 2010 proporcione, à editora supramencionada, as necessárias condições para que possa regressar e ocupar o lugar que merece, de destaque, no seio da comunidade de caçadores!

7 de dezembro de 2009

A Faca de Caça

Faz parte do equipamento de qualquer caçador e desempenha uma função de primordial importância, embora, por vezes, seja relegada para segundo plano.
Mesmo assim a faca não deixa de ser um utensílio e uma presença indispensável nas jornadas de caça.

Aquando da aquisição de uma faca para a actividade venatória convém termos a consciência de que estamos a adquirir uma ferramenta de trabalho e que, apesar de poder ficar muito bem à cintura, a escolha poderá não ser a mais indicada, pelo que se torna necessário identificar o fim a que se destina antes de adquiri-la, pois uma que seja própria para rematar já não poderá ser a mais propícia para esfolar e o mesmo se passa com a lâmina, pois se a intenção é mantê-la permanentemente afiada convém que não seja em carbono ou num aço muito duro, por dificultar, precisamente, a amolação.

Há modelos muito bonitos, de grande qualidade, em metais cujas ligas e métodos de transformação apenas são conhecidos por quem as junta, com lâminas feitas a primor, cabos em marfim e madeiras exóticas, artísticamente esculpidos e trabalhados, mas que custam alguns milhares de euros e encontram-se noutro patamar sem, no entanto, perderem as qualidades de uma verdadeira arma de caça.

A faca é, assim, nos seus diversos modelos, configurações e múltiplas funcionalidades, um auxiliar importante e imprescindível, determinante até, para o bom sucesso da jornada, que não deve ser desprezada.

6 de dezembro de 2009

O Livro do Caçador

"O Livro do Caçador", composto e impresso no ano de 1957, pela Neográfica - Lisboa, foi inserido na "Campanha Nacional de Educação de Adultos", levada a cabo naqueles tempos. Possui 5 capítulos que abordam, desde o "Tiro de Caça" à "Descrição de Alguns Processos de Caça", diversos temas de grande interesse e de muito valor ao longo das 188 páginas que o compõem.
Integra perfeitamente os volumes d"A Caça em Portugal", referidos abaixo, e complementa-os.

O prefácio é da autoria de João Maria Bravo, individualidade de referência na caça do séc. XX português, que o descreve deste modo (um pequeno excerto do prefácio):

- "Caçador, este é o teu livro, o livro com que procuramos aperfeiçoar-te a arte de caçar.
Será esta a primeira vez que ouves chamar arte à caça, essa coisa que apaixona mais de cem mil* portugueses, e te faz correr quilómetros e quilómetros, às vezes, quase já sem forças, de barriga a dar horas e o fato rasgado pelas estevas ou pelo tojo, empurrado por essa ânsia de aplacar o vício terrível, que não perdoa, e que, quanto mais se pratica, mais vício se torna.
Dissemos que caça é arte.
É arte «fechar» uma perdiz que nos passa, puxada pelo vento, a mais de quarenta metros, por cima da cabeça. É arte «enrolar» o coelho, que «picado» pelos cães, se vai enfiar no moroiço de pedras. E tu, se conseguires «pendurar» a perdiz ou o coelho que te saltou nessas condições, és um artista."


Trata-se este excerto de um excelente convite à sua leitura.

*hoje, o número de caçadores portugueses é cerca de trezentos mil.

1 de dezembro de 2009

O Coelho Amarelo

Para quem vai caçar na manhã seguinte, nada melhor existe do que uma noite bem dormida e descansada, mas eu deitei-me tarde, demasiado tarde para quem necessitava de ter todos os sentidos despertos e alerta.

No dia anterior já havia verificado o material, preparado a espingarda, os cartuchos, a documentação, o vestuário. Aos cães, servi-lhes uma refeição reforçada e tratei de consultar a previsão meteorológica, sobretudo em relação à direcção do vento, temperaturas e pluviosidade, pelo que tudo tinha preparado de véspera.

Nesta manhã acordei com o ladrar do Galileu, faltavam cinco minutos para o despertador tocar. Este cão tem destas coisas extraordinárias. Ele possui noção das horas e sabe em que dias é que vou caçar.
Já em pequeno, quando ainda dormia dentro de um caixote de papelão na garagem e o agasalhava com uma manta durante a noite, ele deitava-se e esperava que o fosse aconchegar, depois ajeitava-a com a boca até ficar com a cabeça totalmente coberta, e, assim se deixava permanecer.

Geralmente coloco o despertador para as seis horas da manhã. Isso dá-me tempo, mais do que o necessário para fazer tudo nas calmas e sem agitação. Ele sabe disso. A Galiza também, mas é mais madura e mais paciente do que o Galileu.
Acontece que quando desactivei o despertador, acabei por adormecer novamente.

Faltavam 10 minutos para as oito da manhã e acordo, desta vez, em sobressalto. O Galileu ladrava e, ao longe, conseguia aperceber-me da existência de disparos. Apesar de cansado, ensonado, sabendo do frio que fazia no exterior, da ameaça de chuva, toda a vez que ouvia um tiro, sentia um desespero tal, que nem dormia, nem deixava dormir. Ora rebolava para um lado, ora rebolava para o outro. A única solução era mesmo levantar-me.

Espreito pela janela do quarto e tinha os dois cães a olharem para mim, em pé, de orelhas afitadas, cauda levantada e estáticos, ambos mudos.
A previsão falava em aguaceiros durante a manhã, mas o céu estava limpo. Abri a janela, falei com os cães, que já corriam, já saltavam, já abanavam as caudas. O reboliço era total dentro do canil e decido ir por eles, que bem merecem todas as atenções.

A Galiza é sempre a primeira a entrar no atrelado, seguida pelo Galileu e lá fomos.

No local já se encontrava uma viatura estacionada e estavam na caça, pelo que optei pelo trajecto onde seria menos provável encontra-los, o qual era o mais difícil também. Quem chega tarde tem que se contentar com o que lhe resta, pelo que a minha preocupação era tomar um rumo que não os prejudicasse, e, assim procedi.

Segui pela linha da costa, entre um muro de pedra seca e o mar.
O terreno era pedregoso, recortado por ribeiras, babosas, muitos juncos e pouco silvado.

Nunca tinha caçado um coelho amarelo.
Foi no regresso. Estava ameijoado atrás de uma pedra, sobre um terreno de cascalho, onde essa pedra que o encobria era pouco maior do que o seu tamanho e era a única daquelas dimensões, não havendo outra semelhante, nem maior, num raio de cinco metros.
Saiu ao Galileu e deixei-o alargar-se o suficiente. A Galiza trouxe-o e ficamos os três, cada um à sua maneira, a admira-lo.

Foi um dia de caça diferente, aliás, não há nenhum dia de caça igual e este não foi excepção,... pois será para sempre o dia do coelho amarelo!

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