21 de janeiro de 2007

A Foice de Caça

Como referido anteriormente a foice de caça de Santa Maria possui características próprias e diferentes das construídas nas outras ilhas do arquipélago e mesmo no continente português, nomeadamente quanto às dimensões, peso, comprimento do cabo, formato, entre outras, mas estas serão as mais importantes.

A que irei descrever foi-me fabricada neste concelho de Vila do Porto pelo Senhor Hélio Rebelo, pessoa bastante afável, educada e atenciosa, cuja vida profissional nao é a de ferreiro, embora realize alguns trabalhos sempre que solicitado. Foi instruído nesta arte pelo seu pai, desde os tempos de meninice e cuja actividade desenvolveu até ser chamado para o serviço militar, no então ultramar português. Quando regressou optou por seguir outra ocupação que o mantém afastado da forja por largos períodos de tempo.

Quando finalmente teve oportunidade contactou-me, aliás como estava combinado, para poder acompanhar o fabrico da minha foice, que a ele havia encomendado e que aqui irei descrever.

Inicia-se a construção da foice por acender a forja e depois do aço estar em brasa, para melhor ser moldado, inicia-se por encalcar, ou seja tornar plana a face do Alvado, secção onde irá encaixar o cabo.

Assim a foice é composta por 4 partes:

-Alvado
-Corte
-Volta
-Espigão

A Volta, devido à sua configuração, é a mais trabalhosa de efectuar, mas dizia eu que se começa por encalcar...



De seguida procede-se à formação do alvado, o local onde se irá encaixar o cabo...




Poderão ser encontradas peças destas montadas em cabos de madeira de dois tamanhos difrentes.
Um com cerca de 50cm e outro de 150cm.
O primeiro é utilizado com mais frequência pelo caçador que faz uso da espingarda, em virtude da facilidade no seu maneio, enquanto o mais comprido é preferido pelos batedores.

Decorrida a fase do Alvado, inicia-se a do Corte, a parte da lâmina propriamente dita, aquela que o caçador usa para abrir caminho por entre a vegetação agreste.



Só depois dá-se forma à Volta, que foi a tarefa mais longa e esforçada depois da construção do Alvado.




O Espigão é a parte seguinte...





... que depois de formado é dimensionado.


Terminada esta acção temos a foice em bruto, pois falta tempera-la adequadamente e fazer a folha de corte, e só aí sim, o trabalho estará completo. Esta tarefa exige aqueles conhecimentos que se passam de pais para filho e que com toda a certeza o Sr. Rebelo possui dada a qualidade do trabalho final. Interessa salientar que o aço da foice não deve dificultar o seu amolamento, para que o utilizador possa, no campo, com uma pequena lima, manter o gume afiado sem esforço. Daí a importância da têmpera a fim de tornar a foice numa peça de trabalho muito resistente, mas de fácil manutenção.



Finalmente terminada, depois de muito esforço, e pronta a ser montada e utilizada.

O objectivo da foice na caça é o de coadjuvar o caçador na ultrapassagem de obstáculos, alcançar zonas de dificil acesso, prender a peça para ser cobrada e muito raramente como arma de arremesso na caça ao coelho, mas isto só realizado pelos mais habilidosos!

Como são ferramentas típicas e de fabrico artesanal, não existem duas iguais, o que as valoriza ainda mais.

Em Santa Maria e 600 anos depois, ainda se caça ao coelho com foice.
Apesar do seu uso não ocupar a posição de destaque inicial, persiste em proporcionar-nos muita alegria e orgulho por possuirmos um utensílio precioso ao mesmo tempo que nos permite reviver e participar numa manifestação centenária de cultura e de tradição que é a Caça e as suas envolventes.

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© Pedro Miguel Silveira

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