24 de fevereiro de 2007

Coelho Trepador

Passou-se numa distante Quinta-feira, do mês de Agosto de 2005.
Acordei pelas 05h30. Já tinha o material todo preparado de véspera, pelo que, da cama para o terreno de caça, pouco demorei.
No local, cheguei a tempo de vislumbrar os primeiros raios de sol, que acabavam de despontar.

Esperei que passassem mais alguns minutos e assim que entendi, montei a espingarda, engatei o cinturão, soltei o Roquete e libertei o espírito ao mesmo tempo que me deixei envolver na imensidão de montes e vales, repletos de cores, de cheiros e sons que o Roquete investigou minuciosamente, esquadrinhando todos os recantos da paisagem.

Num silvado, situado num canto duma pastagem, bem protegido dos elementos por muros de pedra seca e bem exposto ao calor dos primeiros raios de sol, o cão ladrou, ganiu, saltou e por fim decidiu-se a mergulhar no emanharado de folhas, ramos e espinhos, que balançaram para todos os lados, devido ao drama do predador e da presa que se desenrolava no interior. Coloquei-me em posição, que até era boa, e esperei inquieto e suspenso.

Tratava-se de um terreno, numa encosta, que descia em escada até chegar a um precipício, de basalto negro e de terra vermelha, que caía na vertical em direcção ao mar. Era também rasgado por um ribeiro, mas não lhe perdia a vista sobre toda a sua extenção do lugar onde estava. Só não vislumbrava para lá da parede de pedra, que era alta e bem fechada, que protegia a moita, mas que o coelho não conseguiria, jamais, transpor. Asseverava eu!
Só poderia correr para mim ou para baixo e, em ambas as situações, conseguiria atirar bem e com êxito, disto me convencia, pelo que me deixei permanecer e aguardei inquieto e suspenso.

Finalmente saiu do silvado, sustendo tão desalmada correria a um metro da sarça e bem à minha frente, a cerca de 10 metros. Por detrás estavam as silvas e nelas o Roquete que lhe seguia o rasto frenética e ruidosamente. De imediato e sem pensar alinhei-o com 30gr de chumbo, mas optei por não arremessa-las. Não seria justo, nem seguro para o podengo, que não tardaria em aparecer e é de bom sangue fuzilar o coelho daquela maneira.

O tempo parou e, nesse instante, que se fosse transposto para o tempo dos relógios, duraria, bem à vontade, uma hora, o coelho olhou para mim e com um salto apoiou-se numa pedra, depois noutra e assim foi subindo o muro até transpor completamente tal obstáculo de pedra, que tinha bem mais de um metro de altura, embora não fosse exemplo do melhor prumo, e que pensei ser suficiente para desencorajá-lo a seguir naquele sentido.
Tão surpreso fiquei que acabei por não disparar e pelo receio que tive da chumbada poder fazer ricochete naquela parede velha e lá se foi o coelho, que também era velho, e que naquela manhã foi mais sabido do que eu!

Mais à frente, na margem do ribeiro, rebentou outro levantado pelo Roquete que o seguiu. Decidi atirar. Se acertasse, segurava-o com o segundo, mas falhei e acabei por conservar um cartucho. Foi uma boa decisão, porque a espoleta acabou por ter melhor destino, mais tarde, nessa mesma manhã.

Levei da Browning Cinergy, que me cativou desde o lançamento, mas por muita qualidade e boniteza que exibisse, nunca me permitiu o gozo e as alegrias que tive com a Beretta 686, anterior, e que tanto me arrependi de tê-la vendido. Acabei por ceder a Cinergy, porque detestei a assistência da marca e nunca me avezei àquela coronha (tipo lombo de javali), que me surpreendia toda a vez que disparava, pois desconhecia sempre a direcção e o desfecho da chumbada.

Já não recordo a espingarda nem possuo o cão que me acompanhou, mas esse coelho ainda vive e é bem real na minha memória, devido ao lance e à qualidade da lição que me deixou!

Sobre o blogue

Contacto: ribeira-seca@sapo.pt
número de visitas

1 - Pertence-me e não possui fins comerciais;

2 - Transmite a minha opinião;

3 - Os trabalhos publicados são da minha autoria;

4 - Poderei publicar textos de outros autores, mas se o fizer é com autorização;

5 - Desde que se enquadrem também reproduzirei artigos de imprensa;

6 - Pela Caça e Verdadeiros Caçadores;

7 - Em caso de dúvidas ou questões, poderão contactar-me através do e-mail acima;

8 - Detectada alguma imprecisão, agradeço que ma assinalem;

9 - Não é permitido o uso do conteúdo deste espaço sem autorização;

10 - Existe desde o dia 21 de Outubro de 2006.

© Pedro Miguel Silveira

Arquivo