Há um grande empreendimento
turístico no Grupo onde sou responsável pela área agrícola. Apoia-se numa estrutura
hoteleira com “bungalows” (um "lodje"), restaurante-bar, piscina, entre outros produtos e serviços de elevada qualidade, e num
parque com 20.000 Ha, vedado, onde existem diversos animais soltos e se organizam
passeios ditos “safaris”, para sua observação, sendo ainda possível fazer percursos
a pé, de btt ou de burro.
Existe ainda um barco para
passeios no mar, dado que o "lodje" fica junto ao rio Coporolo e a uns 40 Km de
Benguela.
No Sábado apareceu morta uma
zebra… por sinal a mais velha e a guia da manada de cerca de 20 que ali foram
reintroduzidas, vindas da África do Sul, 2 anos atrás. Ao que dizem já andava
coxa há uns dias, e até a viram deitada… Sábado de manhã estava morta.
Como sempre, a despeito das
excelentes intenções, os ecologistas, protectores e amantes do ambiente, amigos
dos animais, compenetradíssimos na pegada ecológica e nos seus princípios
elevados de conservacionismo aprendido no canal da National Geographic e leituras
afins, que são quem quase sempre dirigem estas estruturas, baseados em teorias
e nenhum conhecimento prático, na força da sua juventude, colapsam quando há
problemas… falta-lhes andar a pé no terreno, ao Sol e à chuva, conhecer as
gentes e os animais-mesmo não os animais made in Disney, e falta-lhes uma
sensibilidade diferente, mais realista e dura, menos poética sobre a Natureza
que é magnífica mas insensível e cruel.
A zebra tinha metido uma pata num
laço! Quebrou-o e soltou-se, mas este permaneceu agarrado à perna, num corte
circular, largo, além de ter provocado feridas na outra também. Gangrenaram e
provocaram a morte do animal, que poderia ter sido eventualmente salvo com uma
injecção de antibiótico, se alguém com outro entendimento e percepção das
coisas, tivesse agido… debilitada a sua captura e internamento na zona da
quarentena não era assim tão difícil.
No entanto chorou-se a morte do animal e até se lamentou que as outras, aflitas e com pena daquela, se mantiveram por ali… coitadas!
No entanto chorou-se a morte do animal e até se lamentou que as outras, aflitas e com pena daquela, se mantiveram por ali… coitadas!
No mais do resto… o que fazer?
Ninguém sabia…
Bom, primeiro, as zebras não têm
pena… elas seguem a zebra mais velha, a mãe de pelos menos duas, que é
naturalmente a guia. Se esta se deita e morre, pois ficam desorientadas até
perceberem que ela não se levanta mais, então outra toma o lugar daquela, as
outras seguem-na e a vida continua!
Depois: O laço parece ser velho…
aquela zona antes de ser vedada era muito batida pelos carvoeiros (que
armadilham muito) e as pessoas de algumas aldeias da zona caçam com laço.
Porém não se usa cabo de aço novo
e sim o que se apanha, normalmente usado, é algo inconclusivo.
Ter sido na pata de trás, sugere acidente e não armadilha posta para isso…
Importa saber onde é que foi o local da captura, pois se foi perto da vedação pode indiciar ter sido acção de caça, passaram vários dias mas será ainda possível descobrir onde foi que ela lutou para se soltar.
Ter sido na pata de trás, sugere acidente e não armadilha posta para isso…
Importa saber onde é que foi o local da captura, pois se foi perto da vedação pode indiciar ter sido acção de caça, passaram vários dias mas será ainda possível descobrir onde foi que ela lutou para se soltar.
Há que tomar medidas, procurar o
local, dar uma volta à vedação para ver se há indícios de esta ter sido pulada
ou mesmo cortada.
Também procurar outros laços…
perdidos ou colocados. Se foi acto de caça, abre um precedente que é preciso
evitar. Estamos na época seca, a melhor para armadilhar, pois os animais se
concentram mais e sabe-se qual o seu caminho para a água dos bebedouros e as
comidas, certas e determinadas.
Há ali em volta gente dispersa e
uma pequena aldeia, são pastores, gente do mato, bravia e pouco sensível a
“lodjes turísticos” e outras coisas que nem entendem. Vivem do que o mato dá
mas podem ser postos deste lado se houver interacção com o soba e com a
população nesse sentido, de guardarem até a cerca e impedirem outros, vindos de
longe e que agora circulam subindo para o rio na época seca, de fazerem o que
sempre fizeram, cortar vedações que lhes vedam o acesso milenar à água e pasto,
pôr armadilhas para caçar e comer - aliás dependem mesmo disso. Para quem vive
do seu gado, trocando pontualmente um animal por farinha ou sal e panos, do
leite e da colheita de mel, deslocando-se em função do pasto espontâneo e da
água existente nas nascentes ou rio, um parque turístico para se ir ver
animais, com uma piscina para lazer, é algo de transcendente!
A zebra, que podia ter sido
salva, foi esfolada e a pele congelada (nem sabiam como a manter) para mandar curtir,
nas aldeias de pastores há quem faça esse trabalho e tenho amigos que me
tratarão disso.
A carne, imprópria (outro
detalhe…) uma parte serve para os crocodilos, a carcaça arrasta-se para onde
seja pasto de chacais, gatos, aves e outra bicheza pois na Natureza nada se
perde!
Foi pena! Mas é a dura realidade
da vida no mato e em África, apesar das cercas e dos "lodjes", onde há coisas que
nunca mudam e com as quais temos de contar e de viver!
Texto e foto da autoria de António Luiz Pacheco