12 de setembro de 2010

Os Coelhos de São Jorge

Desconhece-se se alguma das actuais espécies cinegéticas açorianas eram já existentes no arquipélago à data da chegada dos primeiros navegadores, o certo é que antes do povoamento foram lançadas nas diferentes ilhas, perdizes e codornizes, entre outras aves e diversos animais como as ovelhas, cabras, porcos e também alguns coelhos que acabaram por encontrar nestas ilhas condições favoráveis e muito benéficas para o seu estabelecimento e desenvolvimento.
São Jorge é o nome de uma das nove ilhas que compõem o Arquipélago dos Açores e localiza-se no Grupo Central, também constituído pela Terceira, Graciosa, Faial e Pico, distanciando-se desta última por apenas 15 km e caracteriza-se por ser estreita e comprida, possuindo em 2001 uma população de 10500 habitantes.
Uma das actividades económicas mais importantes da ilha reside na exploração agro-pecuária, sobretudo na produção de carne e de leite que depois é transformado no afamado e muito apreciado Queijo de São Jorge, detentor de Denominação de Origem Protegida.
Para salvaguardar este valioso recurso o Governo dos Açores, através do *Calendário Venatório da Ilha de São Jorge, para a época venatória de 2010 e 2011, que se iniciou a 01 de Julho de 2010 e terminará a 30 de Junho de 2011, veio permitir a caça ao coelho todos os dias, sem limite de peças por caçador, acrescida do facto de também estar a criar legislação para licenciar e comercializar a carne de coelho bravo de modo a poder diminuir a densidade populacional desta espécie cinegética no arquipélago, feitos que suscitaram nesta região insular uma ampla e acesa discussão que ainda hoje tem lugar.

Por um lado podemos localizar os agricultores e os lavradores que alegam ter os seus rendimentos diminuídos em virtude dos estragos de que dizem ser vítimas, provocados pelos coelhos nas pastagens e nas plantações.
Por outro temos duas facções de caçadores, uma prudente no acolhimento e outra contra a instituição de tais medidas e ainda temos acima de todos estes intervenientes a Secretaria Regional da Agricultura e Florestas a criar legislação de modo a tentar gerir toda esta conjuntura e o inerente conflito de interesses que acabou por se instalar.
Os agricultores jorgenses de tão lesados que se declaram, já solicitaram até ao passado mês de Julho de 2010, mais de 40 pedidos de correcção de densidades do coelho bravo, os quais resultaram em mais de 5000 abates.
Alguns caçadores, preocupados com esta realidade e conscientes das fraquezas que caracterizam o novel regime de caça associativo açoriano, por se encontrar a dar os primeiros passos, e por temerem que a contínua perda de rendimentos dos agricultores os leve a decidir pela introdução do vírus hemorrágico, consideram ser preferível a caça nos moldes do actual calendário venatório, enquanto a situação o justificar, ao mesmo tempo que se esforçam pela interdição da caça à noite, pela necessidade da existência de uma forte fiscalização e por transmitirem um comportamento adequado do caçador.
Outros, por outro lado, são frontalmente contra, afirmando que o que se passa em São Jorge não é mais do que uma selvajaria, uma matança sem sentido e criticam tanto o que lá se faz, como os que ali vão caçar.
Temos duas correntes de opinião dentro da caça e para melhor compreende-las é necessário ter conhecimento que nos Açores, apesar de existir legislação que permita a criação de Zonas de Caça de Interesse Associativo, a mesma é muito recente, decorrendo ainda a caça neste território insular naquele que é vulgarmente designado por “terreno livre”.
Acontece que não existem dados palpáveis e consistentes sobre a real situação dos efectivos cinegéticos, nem possuem os caçadores, neste quadro, um leque de alternativas que lhes permitam participar num modelo mais elevado, em associação com outras entidades, na resolução desta e de outras dificuldades.
Se por um lado é possível considerar que, na falta de dados consistentes, a decisão da caça ao coelho sem limite, levada a cabo na Ilha de São Jorge, seja fruto de uma enorme pressão e que possa degenerar em actos de selvajaria e de matança gratuita, nas mesmas circunstâncias também é lícito pensar o contrário e afirmar que a medida possa ser razoável e apropriada, até porque todos os que, entre nós, se dedicam à observação e ao estudo das espécies cinegéticas, neste caso do coelho bravo, imaginam o quanto este animal pode ser destrutivo, se se encontrar numa exploração agrícola em números exagerados.
A certeza que subsiste é que, neste momento da História da Caça nos Açores, os Caçadores Açorianos estão completamente limitados nas suas opções e acções.

Sobre a comercialização do coelho bravo açoriano, se nada for alterado e tudo permanecer como está é fácil conceber, no actual contexto, quão dramáticas e nefastas serão as consequências desta actividade para a existência do coelho bravo enquanto espécie cinegética e animal, se a legislação não tiver em conta, nem for adequada à realidade do arquipélago e devidamente assistida no terreno pelos apropriados e necessários meios humanos e materiais para a monitorizar convenientemente e para proceder não só a uma eficaz fiscalização, mas também a uma célere e ajustada autuação das infracções.

É sabido que os Caçadores possuem um papel insubstituível e de primordial importância na gestão dos recursos cinegéticos, responsabilidade da qual não devem ser arredados, porque se interessam e preocupam, porque são activos e diligentes, porque estão no terreno e recolhem informação variada, válida e actual, porque são imprescindíveis para o saudável equilíbrio ambiental e para a segurança das pessoas no controlo das pragas e dos grandes predadores.
Os Caçadores são parte integrante da sociedade moderna, constituem e representam um sector económico importante, pelo que não podem, nem devem refugiar-se em interesses egoístas, por muito apelativos que os mesmos se apresentem, nem permanecerem indiferentes aos acontecimentos que se desenrolam e que tomam, todos os novos dias, as mais diversas formas, sob pena de serem excluídos do debate, de perderem importância e influência e de ser-lhes denegado o poder de decisão.
Situações existirão em que se imporá a manutenção e a inflexibilidade das posições. Apela-se, por isso, a que saibam identifica-las.

*Os calendários venatórios em vigor nas diferentes ilhas poderão ser consultados no seguinte endereço:
Deles apenas constam oito, porque não é permitida a caça na Ilha do Corvo.

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