6 de abril de 2015

O estado da caça em Santa Maria

A época venatória de 2014/2015 será certamente recordada pela mortalidade de coelhos-bravos provocada pela nova estirpe da Doença Hemorrágica Viral (DHV) e pelas dificuldades criadas por uma crise que desanima muitos dos caçadores marienses ao ponto de cederem alguns dos seus cães e desistirem da caça. Nas linhas que se seguem partilharei informação gentilmente cedida pela Direcção Regional dos Recursos Florestais (DRRF), pelo Sr. Dr. Rui Forte, médico veterinário dos meus cães, para além daquela que fui recolhendo, na tentativa de traçar um retrato do estado da caça na Ilha de Santa Maria.

A doença dos coelhos

A primeira ocorrência da DHV surgiu na Ilha Terceira em 1989, tendo-se depois espalhado por todas as Ilhas dos Açores. Em Santa Maria isso teve consequências terríveis na população de coelhos-bravos e domésticos, provocando um elevado número de animais mortos e levando ao fecho da caça por mais um ano. O último surto da doença registou-se na época de 2011/2012.
A detecção dos primeiros coelhos mortos em Santa Maria, nesta época de 2014/2015, registou-se a 05/02/2015, tendo a caça fechado 5 dias depois, desconhecendo-se quando reabre. Em 26/02/2015 já se tinham contado 352 coelhos mortos e em 13/03/2015 contabilizaram-se 805 coelhos mortos pela doença. Infelizmente estes números não reflectem a realidade, porque muitos dos coelhos não chegam a ser detectados por se encontrarem em locais ermos e inacessíveis, pelo que estimo tratar-se de um número maior. A DHV é uma doença infecto-contagiosa, altamente contagiosa, que afecta os coelhos-bravos e domésticos, transmitindo-se por contacto directo ou através de objectos contaminados, roedores e insectos. Manifesta-se cerca de dois dias depois da infecção e provoca uma mortalidade que varia entre a metade e a totalidade da população de coelhos num determinado local. Apesar de não se transmitir aos humanos, a carne dos coelhos afectados não deve ser consumida, porque há sempre o risco de se ingerir carne insalubre. Os coelhos que sobrevivem, permanecem portadores e podem continuar a espalhar o vírus durante cerca de um mês. A prevenção consiste essencialmente no controlo de insectos e objectos contaminados. Nesse âmbito a DRRF mandou afixar em locais públicos da Ilha um boletim informativo onde, para além de informação sobre a doença, indica precauções e expõe algumas normas que devem ser respeitadas na recolha e eliminação dos coelhos mortos. Para esclarecimentos adicionais, deverão os interessados contactar o Serviço Florestal de Santa Maria através do telefone 296 204 685.

Caçadores perdem expressão

A existência deste surto em Santa Maria surge numa altura em que a população dos coelhos ainda não tinha recuperado os níveis anteriores a 2011. Conjugando o menor número de peças de caça, com o fecho antecipado da época venatória e o encerramento dos cães nos canis, com o agravamento das condições de vida e com a falta de uma entidade organizada que represente os caçadores de Santa Maria, muitos têm optado por reduzir despesas que, nos casos mais extremos, resultam na desistência da actividade venatória, embora o número de caçadores com carta válida em Santa Maria pouco tenha oscilado nos últimos 5 anos, mantendo-se entre os 166 em 2010 e os 167 em 2014. O mesmo não se poderá afirmar quanto à emissão das licenças de caça que passaram de 203, na época de 2011/2012, para apenas 107 emitidas em 2013/2014.

Perspectivas pouco animadoras para a caça

Os caçadores marienses deparam-se agora com uma variante extremamente agressiva do vírus da DHV, que lhes está a provocar uma elevada mortalidade na população de coelhos-bravos. Constata-se um afastamento crescente dos titulares de carta de caçador em relação à prática da caça, porque caçam cada vez menos e não podem soltar os seus cães, porque possuem maiores dificuldades em fazer face às despesas decorrentes da actividade e do custo de vida e também porque não se sentem representados. Acresce a tudo isto o surgimento de actividades desportivas e recreativas com elevada participação e potencial para a Ilha, também relacionadas com o uso da natureza e que se desenvolvem em terrenos de caça. Zona de caça e campo de treino Os caçadores de Santa Maria, enquanto associados, nunca apostaram na criação de uma zona de caça associativa ou campo de treino onde se pudesse desenrolar a prática da caça e o treino dos seus cães. Se isso tivesse sido levado a cabo, não se evitaria o surto da hemorrágica, como é lógico, mas teriam quem os representasse, geriam e usufruiam de um espaço, podiam libertar e treinar os seus cães durante todo o ano, investir na formação e nas boas práticas ambientais, inclusivamente minorar os efeitos das maleitas que afectam os coelhos. E até podiam ir mais longe, colaborando com outras entidades e contribuindo para o desenvolvimento da nossa bonita Ilha de Santa Maria. 

Os caçadores que se pronunciem

Perguntou-me “O Baluarte” se estaria na disposição de escrever um artigo de opinião sobre o estado da caça em Santa Maria. Manifesto o meu agradecimento pela oportunidade, sendo que o redigi na qualidade de caçador. Enalteço a pronta colaboração na cedência de informação, da DRRF, na pessoa da sua Directora, Exm.a Sr.ª Eng.ª Anabela Isidoro, e do Sr. Dr. Rui Forte. Relativamente ao estado da caça nesta Ilha, penso que as linhas que escrevi a retratam com fidelidade. Sobre o seu futuro, devem ser os caçadores de Santa Maria a pronunciarem-se.

Artigo de opinião publicado na edição deste mês d' O Baluarte

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